quarta-feira, 29 de maio de 2019

Ressacas: greve estudantil e eleições europeias

À ressaca da manif da greve estudantil de 6ªf passada (24 Mai), juntou-se a do rescaldo das eleições europeias. A greve estudantil global pelo clima voltou a mobilizar milhares de jovens em todo o mundo e também em Portugal. O número de participantes terá sido menor do que em 15 Março, mas o entusiasmo, a determinação e a criatividade estiveram na rua:
https://www.dn.pt/vida-e-futuro/interior/queremos-mobilizar-muitos-mais-estudantes-querem-greve-geral-pelo-clima-em-setembro-10937154.html
https://www.esquerda.net/artigo/greve-climatica-estudantil-imagens-das-manifestacoes-em-todo-o-mundo/61548
https://www.theguardian.com/environment/gallery/2019/may/24/student-climate-strikes-around-the-world
O que me deixou mais desanimado foi ter percebido que o apelo dos jovens a que todos os cidadãos se juntassem a eles não foi correspondido. De facto, o comunicado internacional publicado no 'The Guardian' dizia explicitamente: "We feel a lot of adults haven’t quite understood that we young people won’t hold off the climate crisis ourselves. Sorry if this is inconvenient for you. But this is not a single-generation job. It’s humanity’s job. (...) We’re asking adults to step up alongside us … today, so many of our parents are busy discussing whether our grades are good, or a new diet or the Game of Thrones finale – whilst the planet burns…". Como escrevi anteriormente, a crise climática é apenas um dos componentes da catástrofe ambiental em curso, que, por sua vez, está interligada com as crises social e económica. Ainda assim, a aparente falta de empatia de muitos adultos em relação ao clamor dos mais jovens (os seus filhos, os seus netos...) deixa-me preocupado e pessimista quanto à possibilidade de tomarmos colectivamente um rumo que não nos conduza ao colapso.
O impacto desta jornada também não teve a visibilidade da anterior (15 Mar), com os media mais 'ocupados' com as eleições, a demissão da May, etc.(*). A próxima mobilização - uma greve geral mundial - está marcada para Setembro, coincidindo com a realização da cimeira do clima na ONU (23 Set) e com o 57º aniversário da publicação de 'Silent Spring' (27 Set), o influente livro de Rachel Carson. Parece-me demasiado tempo de 'pausa' para a dinâmica activista, uma vez que as crises climática e ambiental não tiram férias. Esperemos que o movimento XR tenha alguns trunfos na manga... Quanto à organização nacional, na assembleia aberta que decorreu na tarde de 6ªf no jardim de S. Bento (com uma participação reduzida), senti os jovens bastante cansados (o que é compreensível), tendo admitido que precisam de ajuda de outros colectivos para continuar a organizar acções. A única decisão tomada foi promover reuniões de movimentos para preparar o protesto de Setembro. Para já e segundo esta notícia, os sindicatos nacionais não parecem favoráveis a uma eventual acção conjunta...
(* Excepção feita ao Público que disponibilizou uma série de artigos dedicados à greve no suplemento P3: 
https://www.publico.pt/2019/05/24/p3/reportagem/a-luta-climatica-estudantil-voltou-as-ruas-de-olhos-postos-nas-eleicoes-europeias-1874049
https://www.publico.pt/2019/05/24/p3/noticia/escola-atl-casa-universidade-trabalho-preciso-levar-sofas-rua-1874068
https://www.publico.pt/2019/05/24/p3/noticia/a-luta-dos-estudantes-por-justica-climatica-pode-ser-um-novo-maio-de-68-1874030
https://www.publico.pt/2019/05/24/p3/noticia/parents-future-responsabilidade-adultos-jovens-tambem-agir-1873971
https://www.publico.pt/2019/05/24/p3/noticia/um-pai-e-uma-filha-em-greve-isto-nao-e-uma-luta-geracional-1874013)

Quanto às eleições europeias, foram aquelas em que votei com menos convicção. A campanha a nível nacional foi lastimável (com honrosas excepções) e mostrou como o populismo, de que são acusados os novos partidos da direita, é afinal a prática dos que se dizem democráticos mas recorrem à demagogia e à politiquice, não fazendo qualquer esforço por esclarecer os potenciais eleitores sobre as questões relevantes da política europeia. E não sou o único a afirmá-lo:
https://www.jn.pt/opiniao/pedro-ivo-carvalho/interior/paulo-ataca-pedro-pedro-ataca-nuno-10917979.html 
"Não podemos queixar-nos de um logro, na medida em que, desde cedo, os partidos, sobretudo os mais representativos, assumiram que o sufrágio de domingo era o prefácio das legislativas de outubro. E que, por isso, a agenda sobre a Europa seria um apêndice da agenda sobre Portugal."
https://aventar.eu/2019/05/25/porque-vou-votar-amanha/ 
"(…) Costa ajudou a transformar as europeias num referendo ao seu governo, tanto pelas suas declaradas palavras, como pela crise que inventou para recentrar a campanha (…) uma campanha de costas voltada para a “europa” convidou os eleitores a fazerem o mesmo."
http://areiadosdias.blogspot.com/2019/05/superar-mesquinhez-do-debate-politico.html 
"(...) seria de esperar que o debate político se centrasse sobre o futuro que desejamos e as melhores estratégias para o construímos, no nosso País e no espaço europeu… Lamentavelmente não tem sido assim…"
Quanto aos resultados propriamente ditos, o rescaldo feito por políticos e media continuou a basear-se em saber quem ganhou e quem perdeu, como se de um concurso de feira se tratasse!... O facto mais significativo é que a taxa de abstenção em Portugal chegou quase aos 70% (uma das mais elevadas), o que está em linha com a (falta de) qualidade da campanha (embora possa ter outras causas mais complexas). De resto, os maiores partidos continuam a ter apoiantes fiéis, mas outros vão ganhando terreno - casos do BE e do PAN. Felizmente, os (novos) partidos de (extrema-)direita tiveram votações residuais. No cômputo geral a nível europeu, houve alguns sinais positivos (perda de deputados nas duas grandes famílias partidárias, os sociais-democratas e os democratas-cristãos, e reforço dos partidos com agendas ecologistas) e outros nem tanto (manutenção ou reforço dos ultra-conservadores e da extrema-direita, apoiados nos resultados da França, Itália, Holanda e Reino Unido):
https://www.theguardian.com/commentisfree/2019/may/28/the-guardian-view-on-europe-change-not-decay 



Finalmente, e apesar dos diversos apelos ao voto, mais ou menos apaixonados, convém lembrar que o Parlamento Europeu é uma instituição com muito pouco poder efectivo e que os órgãos da UE sofrem de um grande défice democrático pois têm sido demasiado coniventes com o poder económico e financeiro. Leia-se este artigo da revista Jacobin (conotada com o socialismo radical) que faz um retrato da (pouco democrática) estrutura europeia, que vale a pena ter em conta: https://jacobinmag.com/2019/05/european-union-parliament-elections-antidemocratic

A propósito destes temas, a minha amiga Sofia Neuparth partilhou um desabafo que ressoou em mim e que não resisto a transcrever aqui:
"ouvi muitas opiniões sobre votar e não votar nestas eleições europeias...eu desconfio é que estamos com o foco desalinhado...votemos ou não votemos ou alinhamos com a urgência de pensar-agir ou não vai haver mundo...não vai haver europa (que está senil), não vai haver américa do sul ou china ou o que seja...ou acabamos com as monoculturas, a asfixia dos oceanos, a destruição da biodiversidade, a emissão de todo o tipo de merda, ou não vai haver mundo para os tais políticos tão importantes exercerem as suas poderosas acções de poder!!! continuo a acreditar no amor e não no medo, no atravessar e não no colapsar...sei que cada umaum pensa-age de formas muito diferentes mas há que exercitar cada momento formas de ser que não sejam sobre poder, controle, hierarquia...os temporais não querem saber se somos o trump ou o zé manel da esquina...ainda ontem alguém muito próximo dizia "mas os jovens nem vão votar..." pois eu vi-os na rua lutando por um mundo onde possamos existir, como vejo os estudantes e professores no brasil ou os povos indígenas gritando...existe consciência sim! mas não mora onde onde mora a corrupção, onde mora a vaidade e os carros não sei quê e o nariz empinado de ter privado com um chefe de estado....a política deveria ser o exercício de modulação de um entre-corpos dinâmico e fluido que nutrisse, no viver-junto, uma existência existente..."


Sem comentários:

Enviar um comentário