“The changes needed for a hopeful future will not come about from our
current leaders, which is why all of us who care for future generations and for
the richness of life on Earth, must take the leadership role in their place.” Jeremy Lent
Está a decorrer a semana de acção global pelo clima (20-27
Set)* em simultâneo com uma cimeira extraordinária na sede das Nações Unidas em
New York (‘UN Climate Action Summit’, 21-23 Set) sobre a crise climática (o ‘maior
desafio da humanidade’, segundo o secretário-geral da ONU, António Guterres).
A adesão às greves convocadas mundialmente para o 1º dia (20
Set) foi maior do que a das anteriores contestações de Março e Maio deste ano,
segundo as estimativas avançadas por diversas fontes que apontam para 4 milhões
de manifestantes, e terá sido o maior protesto climático de sempre:
Os apelos dos estudantes, e também do próprio António
Guterres ao convocar aquela cimeira, dirigem-se aos líderes económicos e
políticos mundiais. No entanto, não me parece que na sua grande maioria esses
líderes estejam de facto disponíveis para corresponder às listas de exigências
divulgadas. Esta mesma posição transparece numa carta sarcástica escrita por Lawrence Wang e publicada no site humorístico
McSweeney’s, mas que é supostamente endereçada por um grupo de jovens (‘us, the
future’) aos líderes mundiais: 'Dear leaders of the world - get your shit together'.
Excertos: “We didn’t propagate a way of life that relied on releasing
vast amounts of carbon emissions into the atmosphere. Or a vampiric economic
system that rewards short-term greed at the expense of long-term
sustainability. And we definitely didn’t put our collective fingers in our
collective ears and go LALALALA when scientists repeatedly tried to warn us
about how all of these things were creating the conditions for a climate
apocalypse. That’s on you guys. (…) The
fact that there are children - literal children! - leading the way on solving
this crisis is insane. Insane! (…) you already know what you need to do keep us
from passing 1.5ºC of global warming! Decarbonize the economy. Penalize - and
we mean REALLY penalize - polluters. Incentivize renewable energy research and
production. Shift policy priorities from growth to sustainability. Plant more
trees. Eat less meat. And stop fucking up whatever ecosystems we have left,
because they’re literally all we have left. (…) So if you could kindly get your
shit together and prevent the end of the world as we know it, that would be
fantastic. Because if there’s no future for us to look forward to, why should
we care about yours?”
A situação inconcebível de serem os jovens a chamar a atenção dos adultos para a situação dramática a que estão a conduzir toda a humanidade
tem sido enfatizada pela própria Greta Thunberg em várias declarações suas,
como ainda ontem (21 Set) na cimeira de jovens na sede da ONU,
mas também por vários outros autores como o jornalista Umair Haque.
Num tom mais sério, mas não menos assertivo, o pensador britânico
Jeremy Lent defende igualmente que não serão os actuais líderes mundiais a
tomar as medidas necessárias para enfrentar a actual crise ecológica e
existencial.
Excertos: “(…) our global leaders currently have no intention to make
even the feeblest steps toward changing the underlying drivers of our society’s
self-destruction. They are merely marching in lockstep to the true forces
propelling our global civilization: the transnational corporations that control
virtually every aspect of economic activity. These, in turn, are driven by the
requirement to relentlessly increase shareholder value at all cost, which they
do by turning the living Earth into a resource for reckless exploitation, and
conditioning people everywhere to become zombie consumers. (…) as things begin
to unravel, we see increasing numbers of people begin to question foundational
elements of neoliberal capitalism: an economy based on perpetual growth, seeing
nature as a resource to plunder, and the pursuit of material wealth as
paramount.”
Para além da inacção dos líderes, um outro factor primordial
que tem contribuído para impedir a indispensável transformação social e o envolvimento dos cidadãos
nesse processo é a alienação, desinformação e/ou manipulação perpretadas por
muitos media, pela indústria do
entretenimento, pelo marketing e pelo
consumismo. Esta mesma tese é defendida há vários anos por diversos pensadores
e activistas, com destaque para o académico norte-americano Noam Chomsky – ver
p.ex. esta entrevista recente onde afirma: “Enquanto
a população em geral for passiva, apática e desviada para o consumismo ou o ódio
aos vulneráveis, os poderosos farão o que quiserem e os que sobreviverem
permanecerão para contemplar o resultado.”
No entanto, não posso deixar de saudar o empenho notável de
grandes media internacionais nos
destaques especiais dados à crise climática no período que antecedeu a semana
global de acção pelo clima e a cimeira da ONU, em particular a iniciativa
‘Covering Climate Now’ (à qual aderiu o jornal Público) ou o número mais recente da revista The Economist. No artigo de abertura da iniciativa citada os jornalistas Mark Hertsgaard e Kyle Pope admitem que: "The media’s minimization of the looming disaster is one of our great journalistic failures." Consideram que "the press may at last be waking up to the defining story of our time" mas alertam para que: “Many journalists and news executives continue to see climate coverage as political, and worry that more coverage will be seen as activism.”
Uma boa indicação de que as medidas mais ambiciosas e
urgentes não serão implementadas pelos actuais líderes políticos foi dada pelo
anúncio do governo alemão do novo pacote de medidas para mitigação da crise
climática anunciado pela chanceler Angela Merkel no mesmo dia das greves
globais e na véspera da cimeira da ONU (20 Set) e que já foi criticado pela sua
falta de ambição e evidentes incoerências:
Não posso ainda deixar de realçar que mesmo as reivindicações
dos movimentos estudantis (listadas p.ex. no post de Gideon Polya, citado anteriormente) ou as medidas
preconizadas pelo secretário-geral da ONU (ver site da cimeira), que incluem a descarbonização da economia através
da transição para fontes energéticas renováveis, o fim dos subsídios às
indústrias de combustíveis fósseis e o fecho das centrais a carvão, a taxação
das actividades poluentes, etc. (muitas delas englobadas num pacote designado
por ‘Green New Deal’), não serão suficientes para uma transição efectiva e duradoura
para um futuro colectivo sustentável baseado numa economia regenerativa e
socialmente justa. Isto porque não vão ao fulcro do sistema global capitalista,
produtivista, mercantilista e imperialista (palavras eventualmente
insuficientes e equívocas para descrever a sua natureza complexa) que é a sua
dependência do crescimento permanente da produção e consumo, ecologica- e
socialmente insustentáveis. Esta mesma posição bem mais radical tem vindo a ser
adoptada por um número crescente de pensadores, autores, académicos e
activistas, entre os quais se incluem naturalmente os defensores do
Decrescimento (ver posts anteriores): Gideon Polya (post citado); Umair Haque (aqui ou aqui);
George Monbiot (aqui ou aqui);
Jason Hickel (aqui);
entre muitos outros. Este posicionamento de mudança profunda de sistema
económico, mas também social e cultural, surge igualmente no novo aviso de
cientistas mundiais à humanidade (post anterior) ou na encíclica do Papa
Francisco ‘Laudato Si’ de 2015.
Na Islândia, foi recentemente colocada uma placa junto a um
glaciar que descongelou completamente por efeito da mudança climática (ver p.ex. aqui), na qual
foi inscrita uma ‘Carta ao futuro’ que exprime de forma eloquente a situação em
que nos encontramos: “This monument is to
acknowledge that we know what is happening and what needs to be done. Only you
know if we did it.”
* Para saber mais sobre as acções que irão decorrer em
Portugal até dia 27 Set ver:
https://www.facebook.com/TeachersForFuturePortugal/