“A existência das plantas é por si mesma uma modificação global do meio cósmico, isto é, do mundo que elas penetram e pelo qual são penetradas. (…) Ser significa para elas fazer mundo, e, inversamente, construir (o nosso) mundo, fazer mundo não passa de um sinónimo do ser.” Emanuele Coccia
“A inteligência vegetal implica, ao nível mais
básico, a constituição subjectiva do espaço e do tempo vividos pelas próprias
plantas. (…) [O seu] modo enraizado
de ser e pensar é caracterizado por uma extrema atenção ao local e ao contexto
de crescimento e, portanto, por uma sensibilidade que, por vezes, excede a dos
animais.” Michael Marder
“Se a vida vegetal é também uma vida cultural, esta pressupõe a actividade de uma mente que se exercita antes de tudo e, quase exclusivamente, na forma do próprio corpo. (…) Cada planta parece inventar e abrir um plano de existência no qual não se dá, de facto, oposição entre crescimento e fantasia.” Emanuele Coccia
Este post surgiu na sequência da minha participação numa ‘conversa ecotópica’ que decorreu durante o Silvestre ’25, a convite dos seus promotores (Ordem do Ó e Daniel Tércio), e que teve por base a pergunta “Como é que o mundo aparece a uma planta?”. Acompanharam-me nesse exercício de pensar em conjunto a Fernanda Botelho, o João Beles e o Pedro Ramos (como moderador).
A minha primeira aproximação à pergunta foi a de confessar que, não sendo eu uma planta, ousar dar uma resposta poderia ser desonesto da minha parte e seria sempre um exercício especulativo. Mas isso não quer dizer que não fosse legítimo tentar fazê-lo – quer a partir da experiência directa de contacto com as plantas, quer indirectamente através do conhecimento adquirido por outros. Assumi que valia a pena arriscar, mesmo projectando a minha/nossa visão enviesada de humanos, isto é, sem conseguir evitar antropomorfizar aquele esforço. O que me pareceu mais importante foi tentar não transformar esse antropomorfismo em antropocentrismo, recusando a desvalorização ou o desprezo que projectamos sobre as plantas quando as reduzimos a recursos a ser explorados ou consumidos.
Na verdade, as plantas foram frequentemente olhadas como seres inferiores ou menos dignos de atenção por não possuírem os comportamentos activos dos animais – daí expressões com sentido pejorativo como ‘vegetar’ ou ‘vegetal’ e fenómenos como a ‘cegueira botânica’. Aquela visão hierárquica estende-se mesmo ao interior do reino vegetal, distinguindo as plantas ‘superiores’ (plantas com flor) das ‘inferiores’ (fetos e musgos), consoante o seu grau de complexidade estrutural, mas também menosprezando as plantas que não têm utilidade para o ser humano ou que competem com aquelas que são consideradas úteis – escrevi sobre isso aqui. De facto, não é difícil constatar que a nossa relação histórica e cultural com as plantas tem sido muitas vezes míope, interesseira e utilitarista, embora sempre tenha havido quem soube ouvir e sentir aquilo que as plantas nos comunicavam, inserindo-as nas suas histórias, mitos e cosmovisões – e recorrendo, muitas vezes, à antropomorfização. Na verdade, tem-se assistido nas últimas décadas a uma crítica à desvalorização da vida vegetal, que tem ajudado a desconstruir a redução do mundo vegetal a “meras paisagens objectificadas e associais, seres caracterizados por inércia e apatia, fixidez e imobilidade, ausência de consciência, sentidos e palavras” – que no português do Brasil se designa por “virada das plantas” (ver p.ex. aqui).
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| Ilustração de Mathilde Roussel para o livro 'The Philosopher's Plant' de Michael Marder |
Comecemos então por abordar o encontro das plantas com o mundo. Nesse exercício, deparamo-nos frequentemente com comparações entre plantas e animais em termos de percepção e de consciência do seu entorno. E a comparação não é favorável às plantas: não se mexem, não vêem, não ouvem, não pensam! No entanto, sabemos bem que as plantas reconhecem os factores biofísicos dos quais dependem: a luz (e a sombra), a temperatura, a humidade, a gravidade, os nutrientes do solo, e até diversos compostos voláteis no ar – e reagem a esses estímulos (ver p.ex. aqui). A aparência de imobilidade é outra ideia distorcida que é posta em causa pelas evidências: as plantas podem estar fixas ao seu substrato, mas tanto as suas partes aéreas, como as suas raízes, estão em constante movimento, mas num ritmo geralmente muito mais lento do que nos animais – ver p.ex. aqui ou aqui. Dado o estado actual do conhecimento sobre a biologia vegetal, podemos afirmar que as plantas vêem sem olhos, cheiram sem nariz, ouvem sem ouvidos, transpiram sem pele, movem-se sem pernas e pensam sem cérebro – ver p.ex. aqui ou aqui. Acontece que nas plantas, ao contrário de muitos animais, não existem órgãos sensoriais especializados e a capacidade de percepcionar e sentir o mundo está espalhada pelas suas principais estruturas – folhas, ramos, troncos e raízes –, embora existam diferenças marcadas, em particular, entre as partes expostas e as partes subterrâneas, que respondem a diferentes estímulos. Portanto, embora não se consigam deslocar, as plantas estão profundamente imbricadas e abertas para o mundo.
Outras observações recentes mostraram ainda que as plantas lutam por território, procuram alimento, evitam predadores, fazem armadilhas para as suas presas, conseguem distinguir indivíduos da sua espécie daqueles de espécies diferentes, são capazes de detectar e de responder a sons (de água ou de insectos), e são até capazes de aprender com a experiência – ver aqui, aqui ou aqui. Logo, estão vivas no mesmo sentido que os animais e, assim como eles, exibem formas de memória e de comportamento. Há quem apelide esses comportamentos de ‘consciência’ ou ‘inteligência vegetal’ – ver adiante e aqui ou aqui. No entanto, como disse acima, muitos destes conceitos têm origem no que conhecemos da biologia animal e, ao usá-los para descrever os processos observáveis nas plantas, estamos a ‘animalizá-las’ – o que é uma projecção que pode reduzir ou anular o valor intrínseco das plantas e a sua identidade própria.
Em vez de continuar a abordar a questão de como é que as plantas percebem e reagem ao mundo, podemos voltar à pergunta inicial invocando o autor que a formulou, o filósofo Michael Marder (que já citei anteriormente noutros posts), num ensaio de 2012 (aqui), mas também no seu livro de 2013 “Plant-Thinking: A Philosophy of Vegetal Life”, onde recorre, quer ao conhecimento científico, quer ao conhecimento vernacular, sobre o mundo vegetal. Segundo Marder, o mundo aparece a uma planta não como uma colecção de objectos distintos, mas como uma rede complexa (ou um mosaico dinâmico) de nutrientes essenciais e factores espácio-temporais. As plantas experienciam o seu ambiente como um fluxo constante de estímulos, aos quais respondem com um tipo de memória ao nível celular, em vez de formarem imagens mentais conscientes. Este “pensamento vegetal” é caracterizado por uma “intencionalidade não consciente” e não totalizante, focada na aquisição de recursos e na sobrevivência no seu meio imediato, levando a uma percepção altamente reactiva (‘responsive’) e dependente do contexto envolvente. Portanto, para Marder, as plantas não são seres passivos nem inertes: para ele, o mundo aparece à planta como uma rede de interacções subtis e contínuas, onde a distinção entre actividade e passividade se dissolve.
Marder argumenta que as plantas não agem como os humanos (impondo a vontade), mas são activamente interactivas, moldando e sendo moldadas pelo ambiente. A sua percepção não é baseada nos sentidos humanos, mas numa existência exposta e aberta ao mundo, onde luz, água, solo e ar são constantemente interpretados e integrados. Para ele, o mundo vegetal é um modelo de simbiose, diversidade e adaptação, em contraste com a homogeneização e dominação humanas. Assim, Marder vê nas plantas um modo alternativo de ser-no-mundo: não através do domínio, mas da coexistência, da vulnerabilidade e da interpenetração. A planta, para ele, é um ser pensante de forma não cognitiva e não discursiva, daí usar a expressão “pensamento vegetal” que desafia a filosofia a sair do antropocentrismo e a repensar a subjetividade e a ética ecológica.
Devo clarificar que, para Marder, o “pensamento vegetal” refere-se, simultaneamente, ao modo de pensar não cognitivo, não ideacional e não imagético próprio das plantas (a que ele chama “pensar sem a cabeça”); ao pensamento humano sobre as plantas e ao modo como este é alterado pelo seu encontro com o mundo vegetal; e, finalmente, à relação simbiótica contínua entre este pensamento transfigurado e a existência das plantas – ver aqui. Estes últimos aspectos têm sido desenvolvidos pela ecóloga evolutiva, focada no comportamento das plantas, Monica Gagliano, em particular no seu livro “Thus Spoke the Plant” (2018), onde explora também os temas da sensibilidade, subjectividade e imaginação vegetais. Para não alongar demasiado este post, deixarei um mergulho mais profundo no pensamento de Gagliano para um escrito futuro.
Um outro filósofo que abordou o mundo vegetal foi o italiano Emanuele Coccia, em particular no seu livro “A vida das plantas, uma metafísica da mistura” (2016), onde oferece também ele, de certa forma, uma resposta à pergunta de Marder: o mundo não aparece meramente à planta, ele é feito por ela e através dela. Coccia inverte a perspectiva tradicional: em vez de ver a planta como um objecto passivo no mundo, ele coloca-a como o sujeito primordial da cosmogonia. A planta não contempla o mundo de fora; ela faz e refaz o mundo por dentro, através da sua existência misturada com o ar, a luz, a água e o solo: “É já no corpo da planta que tudo está em tudo: o céu está na terra, a terra é impelida para o céu, o ar se faz corpo e extensão, a extensão é um laboratório atmosférico.”
Para Coccia, as plantas são forças criadoras (cosmogónicas) que transformaram a Terra num planeta habitável (para os animais) – o autor refere-se na verdade ao papel de cianobactérias primitivas na criação de uma atmosfera rica em oxigénio, na medida em que foram os primeiros seres a produzir oxigénio por fotossíntese (as algas, as plantas e as cianobactérias modernas continuam a fazê-lo), tendo conduzido ao evento conhecido por ‘Grande Oxigenação’ que se iniciou há cerca de dois mil milhões de anos. Ele acrescenta que o seu poder criador se estende à capacidade de transformar energia solar em matéria viva, funcionando como um “alambique alquímico” ao ar livre, argumentando que a vida orgânica, tal como a conhecemos, é uma consequência directa da capacidade vegetal de misturar elementos, de ligar a terra e o céu. Assim, o mundo que co-habitamos – com ar respirável, ecossistemas complexos e ciclos energéticos e matéricos – seria um produto da vida vegetal. Portanto, o mundo aparece à planta não como um cenário externo, mas como um processo contínuo de co-criação entre planta e mundo.
Faço aqui um pequeno aparte para fazer notar que, embora esteja alinhado, no essencial, com a visão de Coccia, parece-me que ele acaba por inverter o antropocentrismo em fitocentrismo e não consegue evitar algum pensamento hierárquico, ignorando o papel dos micróbios, e em particular do vasto e diverso mundo bacteriano, como (co)criadores de mundo, pelo menos em pé de igualdade com as plantas – ver aqui ou aqui.
Por outro lado, um dos conceitos centrais de Coccia é a “metafísica da mistura”. Ele propõe que a vida é, essencialmente, um processo de mistura recíproca. Ao respirar, os animais absorvem as ‘sobras’ do metabolismo das plantas (o oxigénio). As plantas, por sua vez, absorvem o dióxido de carbono exalado pelos animais. Para Coccia, este ciclo não é apenas biológico, mas ontológico: a vida é o ritmo dessa interpenetração. Ele apelida esta interconexão e interpenetração o “sopro da vida”. O sopro é para Coccia a chave para a coincidência entre mundo e vivente, entre sentido e existência: é o que permite que o mundo seja vivido, sentido e produzido a partir de dentro. Assim, o mundo aparece à planta como um fluxo constante de trocas materiais e energéticas, onde as fronteiras se dissolvem. A planta vive num estado de mistura universal, onde o exterior e o interior, o ser e o mundo, coincidem. Neste aspecto, a tese de Coccia apresenta evidentes afinidades com a proposta da antropóloga cultural canadiana Natasha Myers (que citei em posts anteriores) de “conspirar com as plantas”, como forma de coexistência e de reciprocidade entre humanos e plantas.
O carácter co-criativo (podíamos dizer, simpoiético, na acepção da filósofa norte-americana Donna Haraway – ver p.ex. aqui) da ontologia vegetal é obviamente extensível às restantes formas de vida, incluindo os humanos. Ou seja, todos os seres vivos são sujeitos culturais – criadores de mundo. Esta visão realista e honesta do mundo vivo contrasta com a visão distorcida do excepcionalismo humano, ainda comum, herdada do Iluminismo e da Modernidade (naturalmente rejeitada por qualquer dos autores que citei). Na verdade, Marder, Coccia, Myers, Haraway e outros tantos pensadores, sugerem que temos muito a aprender com as plantas, instando-nos a adoptar formas de ver e estar no mundo em consonância com aquelas que podemos apreciar no mundo vegetal – ver adiante.
Uma das manifestações do carácter co-criativo da interacção das plantas com o mundo é o fenómeno de co-evolução que ocorre entre certas plantas e os insectos que as polinizam, o qual tem gerado uma diversidade morfológica extraordinária de uma das estruturas mais notáveis das plantas – as flores, ver p.ex. aqui. Numa das famílias das plantas com flor, as orquídeas, essa interacção levou a relações tão íntimas entre a planta e o seu insecto polinizador que, em certos casos, a flor mimetiza o corpo da fêmea de uma única espécie de abelha que é o seu principal polinizador (note-se que se trata de um abelha solitária, ou seja, não gregária, como as abelhas melíferas). A orquídea seduz assim os machos a tentar copular com a sua flor, convertendo o macho (enganado) em disseminador do seu pólen. Donna Haraway dá precisamente como exemplo de simpoiese (no seu livro “Staying with the trouble”) a orquídea Ophris apifera (ou erva-abelha, espécie que ocorre em Portugal) cuja abelha polinizadora se extinguiu (pelo menos numa parte da sua área geográfica natural), constituindo pois a sua flor a única imagem que temos do que seria a forma daquele insecto. Ilustrando o seu argumento com um cartoon da autoria de Randall Munroe (que reproduzi no meu post sobre simpoiese), Haraway sugere que a flor da erva-abelha pode ser vista como uma tradução vegetal (ou ilustração tridimensional) do corpo de um insecto – neste caso, a sua abelha polinizadora – no seu próprio corpo! Pode ter demorado talvez centenas de milhares de anos a ser aperfeiçoada, mas é certamente uma obra de imaginação vegetal notável. Tanto nesta, como em centenas de outras espécies em que os mesmos processos co-criativos estiveram em jogo.
Acompanhando as abordagens dos autores que citei neste post, podemos afirmar que as plantas exibem um grau de sofisticação na sua relação com o mundo, que validam o recurso a expressões como “sensibilidade vegetal” ou mesmo “inteligência vegetal” para descrever os processos complexos que estão envolvidos nessas interacções e entrelaçamentos. Ao mesmo tempo, é importante não assumir que a expressão “inteligência vegetal” significa que as plantas pensam ou sentem como os humanos, mas sim que elas possuem capacidades próprias e complexas de processamento de estímulos e de adaptação que lhes permitem sobreviver e prosperar nos ambientes onde ocorrem e onde interagem com múltiplos outros agentes. Nesta perspectiva, não-antropocêntrica, o mundo aparece a uma planta, como a qualquer outro vivente, como um campo de possibilidades de estar no mundo e de fazer mundo, em processos de devir em conjunto, naturalmente simpoiéticos e co-criativos.
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| Ilustração de Mathilde Roussel para o livro 'The Philosopher's Plant' de Michael Marder |
Mas existem também ilações éticas e políticas a retirar destes exercícios filosóficos. Marder propõe que pensar como uma planta é sair da lógica do controlo e da totalização, e abraçar a exposição contínua ao mundo. As plantas usam energia de forma não extrativa e operam de modo descentralizado e simbiótico. Um galho pode tornar-se uma nova árvore; as raízes interligam-se em redes subterrâneas; e não há um “cérebro” que controle o todo. Marder vê nisso um modelo político alternativo não hierárquico, resiliente e adaptável, espalhando-se como rebentos em diferentes locais. Para ele, a política humana pode aprender com as plantas a ser mais flexível e colaborativa e menos autoritária ou extrativista.
Marder insiste que “ainda não é tarde demais para aprender com as plantas”. Elas são sobreviventes sagazes e capacitados, com milhões de anos de adaptação, e promovem a diversidade em vez da dominação. Diferentemente dos humanos, que frequentemente destroem ecossistemas, as plantas sustentam e ampliam a vida. Ele fala em “pedagogias vegetais”: lições de resiliência, comunicação eficiente, solidariedade e integração (simbiose). Eu acrescento ainda a desaceleração, inspirada na temporalidade própria das plantas, que estimula a contemplação e a atenção ao mundo.
Marder refere ainda que as plantas habitam uma heterotemporalidade — um tempo do outro, determinado pelos ciclos naturais como as estações, a luz solar e os ritmos diários. Para ele, as plantas não possuem um tempo próprio, pois a sua existência está profundamente entrelaçada com forças externas. Elas não lutam contra a repetição, como fazem os sujeitos humanos, mas habitam-na plenamente, crescendo e decompondo-se em sintonia com o ambiente. Essa ausência de identidade fixa torna-as radicalmente abertas ao outro, vivendo um tempo de acolhimento contínuo.
Por seu lado, Coccia enfatiza que pensar a partir das plantas é pensar um mundo onde viver juntos não é uma escolha política, mas antes uma realidade ontológica. Segundo ele, as plantas são o fundamento da existência e ensinam-nos que a vida é essencialmente mistura e comunhão com o mundo. Com elas aprendemos que a nossa própria existência é um fenómeno relacional e generativo, não individual mas colectivo. Ele afirma que as plantas vivem em perpétua contemplação do mundo, fundindo-se com os elementos — sol, água, ar — e renovando-se em ciclos incessantes de crescimento, floração e reprodução. A sua existência não está voltada para um futuro próprio, mas para a geração contínua da vida, simbolizada na flor, que é o “sexo do mundo”. Pensar (e devir) com as plantas, mais do que antropomorfizá-las, é vegetalizar o humano. E em pleno Antropoceno, é afinal também uma urgência ética e ecológica.
Termino como uma citação do texto de abertura do livro “Vozes Vegetais – Diversidade, Resistências e Histórias da Floresta” (2020), co-organizado por Joana Cabral de Oliveira e colegas da USP (Universidade de São Paulo) e que reúne ensaios e depoimentos de múltiplos autores, onde se incluem descrições de práticas quotidianas e de cosmovisões de diferentes comunidades indígenas do Brasil, informadas pelo relacionamento com as plantas do seu entorno: Ao modo das plantas, há pressa em vegetar. O que temos nós a aprender com elas? Se nelas enovelados, quem mesmo, doravante, seremos nós? Plantas são trilha e morada de outros seres. Humanos colhem e pássaros bagunçam os frutos. Abelhas fazem festa nas flores. Galhos se comunicam com o vento, raízes com as hifas, sementes pegam carona nos fluxos e asas. Vegetar é crescer em contiguidade com o mundo, coabitar lugares, aderir e fazer espaços, engajarnos com aquilo que nos circunda – ou, antes, nos atravessa. Criar raiz e lançar sementes. Desterritorializar-se. Propagar, cortar, distribuir, desmembrar-se em qualquer ponto e depois se reconectar. Polinizar, cruzar, misturar, gerar o imprevisível. Brotar na terra, crescer, florescer, frutificar e apodrecer, voltar para a terra. Transformação é o nome do jogo. Vegetar é uma estratégia.









